quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Repensando o Agnosticismo


Em uma postagem publicada em fevereiro deste ano com o nome de “Reflexões de um Agnóstico Neófito”, eu havia comentado que entendia ser o agnosticismo “uma etapa, mesmo que temporária, inevitável”.

Na última semana estive revendo meus conceitos agnósticos estimulado por uma postagem publicada pelo meu grande amigo Ricardo no seu blog “A Arte de Ter Razão”, sob o título de “Prove que Deus não existe”. Na verdade o tema principal nem versava sobre o agnosticismo, mas o assunto descambou para este lado ao travar um diálogo virtual com outro grande amigo, Enéias do blog “Convictos ou Alienados”.

Quem pela primeira vez fez menção ao agnosticismo nos comentários daquela postagem foi o Enéias, o que por sua vez provocou uma discordância da parte do autor nos seguintes termos:


“Enéias, eu não concordo com o que você disse. Deus não existe e ponto final. Não há o que provar. Você acredita em Saci-Pererê, Mula-sem-cabeça, na Fada-do-dente, ou é agnóstico nesses quesitos também?”

Esta pergunta feita de forma categórica despertou-me certo desconforto levando-me a refletir melhor sobre minha posição agnóstica. Pensei:

“Se eu não me considero um agnóstico em relação aos imaginários seres do folclore popular ou em relação aos deuses elencados na mitologia grega, por simplesmente desconsiderá-los como uma realidade minimamente aceitável, então por quais motivos deveria me considerar um agnóstico em relação ao Deus bíblico?”

O comentário seguinte do Enéias só ampliou minha inquietação:

“Sou agnóstico no sentido de que não posso negar ou afirmar (falo de provas) a existência dos ‘seres" elencados pelo Ricardo’. Logo: sou agnóstico no que tange ao Saci, Mula sem Cabeça, Boi Tatá e afins. Como provar ou negar?”


Na minha cabeça não entrava o fato de eu precisar me declarar agnóstico em relação ao Saci-Pererê, Mula sem Cabeça, Boi Tatá e afins. Eu ficava imaginando a situação de ter que responder a um filho quando ele me perguntasse se existe o Bicho Papão:

“Filho, como até hoje ninguém conseguiu provar que o Bicho Papão existe ou que não existe, eu lhe digo que sou um agnóstico em relação à crença no Bicho Papão”.

Que loucura é esta? Qualquer ser humano sensato sabe que não precisa de provas para crer ou deixar de crer no Bicho Papão. Este ser fictício só existe na imaginação infantil por causa dos adultos “bobocas” que um dia a colocaram lá. Considero uma completa falta de bom senso dizer-se agnóstico em relação às coisas que nossa razão não vê o menor sentido (ou necessidade) existirem.


Foi neste momento que me lembrei do princípio lógico exposto na “Navalha de Occam” (já apresentado em postagens anteriores) que afirma que as entidades não devem ser multiplicadas além do necessário, ou em outras palavras, pluralidades não devem ser postas sem necessidade.

No debate cheguei a mencionar o exemplo de uma pessoa que se depara com uma pegada de aparência humana no meio da floresta. O princípio lógico de Occam me obriga a decidir pela explicação mais simples e lógica, ou seja, é a pegada de um homem ou mulher que por aqui passou descalço. O mesmo princípio evita que eu viaje na maionese e comece a conjecturar a possibilidade da pegada ser de um Curupira ou de um Elfo. Por que multiplicar desnecessariamente as entidades?

Algumas proposições são tão absurdas que nem merecem o benefício da dúvida.

Agora, vamos aplicar isto tudo para umas das perguntas chaves da humanidade:

“De onde veio tudo que existe, inclusive a vida?”


Aí vem um sujeito e fala: "Tudo foi criado pelo Duende Verde em parceria com o Surfista Prateado".

Chega então o agnóstico pergunta: "Isto pode ser verificado (provado) empiricamente?" - Não! - é a resposta. Então ele brilhantemente conclui: "Logo sou um agnóstico quanto ao Duende Verde ter criado todas as coisas em parceria com o Surfista Prateado".

Mas quem falou que tal possibilidade deveria existir para ser avaliada como algo a ser ou não provado? Se for assim, qualquer um inventa o que quer, e eu sempre serei obrigado a ser um agnóstico em relação a sua afirmação, mesmo que seja a coisa mais estúpida do mundo.

Até entendo que o termo “agnóstico” conforme o concebeu o biólogo britânico Thomas Henry Huxley em 1876 limita-se a definir alguém que acredita que a questão da existência ou não de um poder superior (Deus) não foi nem nunca será resolvida. Mas infelizmente este termo foi distorcido e atualmente só serve muito bem para aqueles que não possuem fé suficiente para crer plenamente em Deus, mas também não possuem coragem suficiente para descartá-lo de uma vez por todas.


É por causa desta distorção que algumas pessoas respondem à pergunta: “Você acredita em Deus?” afirmando equivocadamente serem agnósticas. Esta resposta não cabe para esta pergunta. Primeiramente é necessário que a pessoa se defina entre um dos lados (teísmo/deísmo ou ateísmo) e então complemente ser agnóstico em relação à escolha que vez. Porém não é isto que acontece. Agnosticismo virou sinônimo de postura neutra e fuga para não ter que se declarar crente ou ateu.

Na minha maneira de entender o ateísmo, ele não é a negação de Deus, mas sim a desconsideração desta possibilidade. E portanto, uma vez desconsiderada a possibilidade, não há o que provar ou deixar de provar.

6 comentários:

  1. Cleiton,

    Você está pensando demais, isso vai acabar te colocando nas fileiras dos 3% de seres humanos que não acreditam no sobrenatural.

    Quanto ao agnosticismo, nos termos defendidos pelo Enéias, faz-me rir.

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  2. Ricardo e Cleiton,

    Quem defende tais conceitos não sou eu (vem do séuclo XIX). O problema é que as pessoas, por mais que se esforcem de forma contrária, enxergam o agnosticismo como meio-termo entre ateísmo e ateísmo - grande equívoco. Alguns até consideram o agnosticismo como "cômodo", quando ele é "honesto" em admitir fragilidades e afins.

    Pergunto: que mal existe no fato da pessoa concluir que é IMPOSSÍVEL pelos meios humanos provar ou negar a existência de deus?

    Respostas:

    1. Se ele entender que é possível provar a existência de deus ele NÃO é agnóstico;
    2. Se ele entender que é possível negar a existência de deus ele NÃO é agnóstico.

    Mais:

    1. Se ele entender que não é possível provar/negar a existência de deus e ainda assim resolver crer em sua existência ele É agnósistico teísta,
    2. Se ele entender que não é possível provar/negar a existência de deus e resolver ser ateu ele É agnóstico ateísta.

    O ERRO GRAVE: ENTENDER QUE SE UM INDIVÍDUO NÃO FOR ATEU OU CRIACIONISTA ELE É AGNÓSTICO (MÉTODO TORPE DE EXCLUSÃO, QUE ESTÁ 100% FORA DO CONTEXTO).

    Insisto: minhas afirmações têm como base o agnosticismo da forma como foi proposto pelo "autor" do termo. Não estou reinventando a roda. Ela já existe e o conceito já existia!

    É lógico que existe ateu VERDADEIRAMENTE ateu - que simplesmente desconsidera a possibilidade da existência de deus. Ponto para ele.

    Existe criacionista VERDADEIRO que se define como tal simplesmente pela fé. Ponto para ele.

    Eu me alinho com aqueles que têm convicção de que é impossível, pelos meios convencionais, provar/negar a existência de deus.

    Sou ateu? Sou criacionista? Qual a minha opção como agnóstico? No momento pendo para o agnosticismo teísta por PURA INTUIÇÃO, não nego! Mas eu estou disposto a me curvar diante de qualquer argumento consistente...

    Em tempo: no contexto do "post" do Ricardo eu salientei que o termo agnóstico em relação SACI e quetais está adstrito apenas à postagem em questão e mais: o termo foi cunhado para se referir especificamente a deus, certo?

    Abraços.

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  3. "É lógico que existe ateu VERDADEIRAMENTE ateu - que simplesmente desconsidera a possibilidade da existência de deus. Ponto para ele."

    Ufa!!! Finalmente nos entendemos. É deste tipo de ateísmo que eu me refiro. O ateísmo que não precisa que se prove ou deixe de provar nada em relação a qualquer tipo de divindade, por não considerar esta possibilidade. Um ateísmo puro e que não é agnóstico, justamente por não estar preocupado em provar o inexistente.

    Que bom seria se tivessemos do outro lado teístas ou deístas não agnósticos que também não estão nem um pouco preocupados com provas ou ausência delas, mas aceitassem finalmente a fé pura como sua única certeza.

    Enquanto muitos podem entender o não agnosticismo como uma postura em que se acredite poder provar ou não a existência de qualquer tipo de divindade, eu entendo o não agnosticismo como a completa ausência de interesse por qualquer tipo de prova - o ateu porque não precisa negar aquilo que nem considera e o crente porque tem a fé e ela lhe basta!

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  4. Ao meu ver, o agnosticismo verdadeiro só faz sentido quando se refere ao ABSOLUTO, pois tudo o que é subjetivo é teoricamente capaz de provar-se verdadeiro ou falso (tarefa da ciência).

    A menos, claro, que inventemos o "agnosticismo relativo", onde aí sim, poderíamos afirmar ser agnósticos em relação a qualquer coisa, até que obtenhamos provas capazes de satisfazer nossos juízes internos (igualmente subjetivos). Se isso for válido, sou agnóstico até mesmo em relação à Torre Eiffel, que nunca vi pessoalmente. E não me servem de prova fotos que poderiam facilmente ser criadas em Photoshop. Nossa, pareço um teórico da conspiração agora. Rs.

    Abraços!

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  5. Post antigo, mas muito bom, assim como os comentários...

    Acho que o rapaz do 2° comentário matou a charada sobre o termo agnosticismo ser algo exclusivo do tema espiritual.

    Mesmo o agnosticismo fosse relativo a todas as coisas, a minha lógica principal é sobre como é vendido as idéias.. como é "vendido" o saci?? como um personagem folclórico e como é "vendido" Deus?? como uma entidade real... dai se aplica nele, deus, o termo. Minha lógica é assim e consigo assim ser um agnóstico teísta mais convicto, hehehe.

    Abraços.

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  6. "Mesmo o agnosticismo fosse relativo a todas as coisas, a minha lógica principal é sobre como é vendido as idéias.. como é 'vendido' o saci?? como um personagem folclórico e como é "vendido" Deus?? como uma entidade real..."

    Como as ideias são vendidas dependerá da cultura onde elas são projetadas. Para um caipira da roça do século passado o Saci era um personagem tão real quanto Deus. Meu bisavô contava histórias de caboclos que tiveram experiências reais com o saci, o lobisomem e outros seres considerados folclóricos.

    Ignorância deles, pode alguém pensar. Onde já se viu acreditar em Saci? Pois é, muitos pensam o mesmo dos deuses mitológicos. E se pensam assim dos deuses mitológicos, não precisa extrapolar muito para aplicar o mesmo pensamento ao deus triúno dos cristãos. Tudo depende da cultura onde você está inserido.

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