quarta-feira, 2 de julho de 2008

Todos possuem um deus


Terminei a leitura do livro “Uma Breve História do Mundo” de Geoffrey Blainey e quero partilhar com os amigos a genial análise final feita pelo autor:

“A tendência da religião era florescer com mais vigor quando a vida cotidiana estava em perigo e quando havia muita dor. A religião florescia quando enchentes, secas e outras catástrofes da natureza eram mais destruidoras, quando a fome estava às portas, e a morte precoce era a expectativa da maioria das pessoas. A religião florescia quando as pessoas viviam da terra e sabiam como era fácil uma colheita, há tanto tempo esperada, ser arrasada por pestes, seca, exaustão do solo ou tempestades. Durante a maior parte da história, a vida humana esteve em perigo. A religião dava as respostas aos acontecimentos inexplicáveis da vida de um estado, de uma região ou de uma família. Satisfazendo uma ânsia profunda e, às vezes, inexplicável, ela era também uma fonte de força e inspiração.
A religião era a base de muitas sociedades que, de outra forma, possivelmente teriam desmoronado. Monarcas poderosos ganhavam muito ao sustentá-la...
No século 20, a religião enfrentou outras dificuldades. Com o aumento da prosperidade e da longevidade, parte do apelo da religião enfraqueceu...
Milhões de pessoas cultas no mundo ocidental se distanciaram dos deuses a quem, quando jovens, haviam sido ensinadas a orar. Parte de sua autoconfiança veio das conquistas da ciência e da tecnologia. A própria ciência era um novo deus racional e era aclamada como possuidora de todo o conhecimento, de toda a sabedoria e de ser capaz de produzir milagres materialistas. O marxismo, durante um tempo, foi uma religião alternativa poderosa. Karl Marx pregava ser o primeiro a descobrir as leis científicas da história da humanidade e que essas leis produziriam por fim um céu, muito embora esse céu ficasse na Terra. Se por um lado a ciência e o comunismo alegavam dispensar os deuses, elas praticamente entronizavam a raça humana e seu potencial, transformando-a em um deus.”
(págs. 336-339).

Interessante não? O conceito de deus como alguém ou algo capaz de responder as perguntas: de onde vim, quem sou e para onde vou, sempre esteve e estará presente na história da humanidade. O ateísmo não é a erradicação por completa do conceito de deus, mas simplesmente a substituição de um deus sobrenatural e transcendente por um outro natural e imanente.

4 comentários:

  1. Cleiton,

    Ao que me parece, a palavra "deus" se desgastou pelo uso. Até aí tudo bem, afinal, as palavras evoluem de sentido e, nessa evolução, perdem sua ligação semântica com suas raízes etimológicas. "Deus" é uma dessas palavras que já não diz muita coisa. Cabe em qualquer lugar onde a ignorância, o medo ou o comodismo nos impossibilitam de enxergar a realidade. Atualmente, a palavra "deus" cabe tanto como "a causa" quanto como "o efeito". É um espécie de coringa, útil em situações em que nos faltam palavras ou respostas.

    Penso que melhor seria se fizéssemos uso de neologismos e procurássemos preservar o sentido mais primitivo das palavras, inclusive da palavra "deus", que de tão sagrada para alguns povos, nem sequer era pronunciada. De qualquer maneira, quem faz a língua é o povo e se o povo quer usar essa e outras palavras de qualquer jeito e em qualquer contexto, que seja.

    Sobre a palavra "ateu", é outra que também vem se desconectando de sua raiz etimológica e assumindo novos sentidos.

    Sobre o livro: Achei o título bastante sugestivo e fiquei com vontade de lê-lo.

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  2. Boa dica e entrará na lista das futuras leituras.

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  3. Olá Cleiton,

    Não entendi nada do que você quis dizer com: "O ateísmo não é a erradicação por completa do conceito de deus, mas simplesmente a substituição de um deus sobrenatural e transcendente por um outro natural e imanente."

    Que eu saiba ateísmo é pura e simplesmente a descrença na existência de Deus. Ou não?

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  4. O que escrevi é apenas um pensamento livre com base neste parágrafo do autor do livro em questão:

    "Se por um lado a ciência e o comunismo alegavam dispensar os deuses, elas praticamente entronizavam a raça humana e seu potencial, transformando-a em um deus."

    Quando o homem descarta a existência de Deus (sobrenatural e transcendente), ele mesmo acaba transformando-se no seu próprio deus (natural e imanente).

    O que eu disse só faz sentido quando fugimos um pouco do conceito tradicional de deus.

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