quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Céticos x Crédulos: A História dos Desafios

por Cleiton Heredia


Já em 1922 se tinha conhecimento de dois prêmios, no valor de US$ 2.500,00 cada (naquela época era uma quantia significativa), sendo oferecidos pela revista Scientific American para o primeiro médium que apresentasse uma autêntica manifestação psíquica visível, e também para a primeira pessoa que pudesse apresentar uma legítima fotografia psíquica (produzir imagens numa película fotográfica com a força do pensamento).

Entre os membros da Comissão de Investigação designados pela revista estava o grande ilusionista Houdini, e não foram poucos os que tentaram burlar a percepção aguçada daquela comissão.

1- Elizabeth Allen Thomson

Elizabeth Allen Thomson foi a primeira pessoa a se dispor ser investigada pela comissão, mas como foi pega em flagrante com 180 metros de gaze presa com fita à virilha, com flores sob os seios e com uma cobra na axila, nunca foi formalmente testada (parece piada).

2- George Valiantine

Na verdade o primeiro médium a ser de fato testado pela comissão da Scientific American foi George Valiantine. O médium espertinho não sabia que a cadeira onde estava sentado tinha sido ligada a um dispositivo que fazia uma luz acender em uma outra sala, toda vez que ele levantasse da cadeira. Foi desta forma que descobriram que os supostos fenômenos sobrenaturais (voz vinda de um trompete que flutuava pela sala) só ocorriam quando a luz acendia.

3- Josie K. Stewart

Uma outra médium conhecida como Reverenda Josie K. Stewart que dizia produzir mensagens manuscritas de pessoas mortas trazidas até ela através de seu guia espiritual Effie, também “quebrou a cara” perante a comissão. As cartas foram marcadas pela comissão e ela falhou por três vezes. Na quarta vez obteve “sucesso”, mas como as mensagens que produziu não estavam nas cartas que haviam sido fornecidas pela comissão, ficou bem caracterizada a trapaça.

4- Nino Pecoraro

As pretensões de poderes sobrenaturais alegadas por Nino Pecoraro, que dizia ter como guia o espírito de Eusapia Palladino, terminaram quando Houdini pegou a corda de 20 metros e a cortou em vários pedaços menores. O grande mestre das fugas Houdini sabia que era fácil conseguir uma folga qualquer ao ser amarrado com uma corda comprida. Nino foi amarrado com cordas menores e, caso não tivesse sido desamarrado pela comissão, estaria até hoje tentando escapar.

5- Mina "Margery" Crandon

O caso mais controvertido e polêmico aconteceu com o quinto candidato ao prêmio, Mina Crandon, mais conhecida entre os espiritualistas como “Margery”. Existem várias versões desta história que, quando contada por aqueles que acreditam na paranormalidade ou nos espíritos, possui detalhes impressionantes, mas que não aparecem quando contada pelos céticos.


Margery era tida como uma médium cujas sessões ficaram famosas pela farta produção de ectoplasma (substância que sai dos espíritos/fantasmas que lhes possibilita materializarem-se e praticar atos). Embora Houdini afirmasse com convicção que tudo não passava de fraude, nada se tem registrado sobre como ela era praticada, nem muito menos que a médium tenha sido pega em flagrante fraudando (este truque deveria ser bom mesmo).

"Dizem" que Houdini chegou assinar um contrato com a revista se comprometendo a reproduzir os mesmos efeitos, porém nunca chegou a cumpri-lo devido a uma estranha viagem (pré-anunciada por uma outra médium) que teve de fazer de última hora. O fato é que a comissão acabou se dividindo em suas opiniões e dissolvendo-se por discussões internas, de forma que o prêmio acabou não sendo pago.


Não precisa nem dizer que os paranormais e espiritualistas têm o caso “Margery” como um marco na história dos fenômenos sobrenaturais não explicados (isto para eles é considerado como uma prova de que estão com a verdade). Por outro lado os céticos ficam irritados por não poderem claramente comprovar que houve fraude, assim como nos casos anteriores. O mistério persiste impossibilitando um diagnóstico conclusivo de ambas as partes (isto é, quando as partes estão dispostas a serem honestas e admitirem suas limitações).


Por outro lado, os espiritualistas e, especialmente, os paranormais acusam os céticos como James Randi de criar desafios com critérios impossíveis já com a intenção pré-disposta de que todo e qualquer caso seja refutado. Li seus critérios e não achei nada tão absurdo. Na verdade suas regras não vão muito além daquilo que qualquer cientista razoável exigiria:


“Se você for um entortador mental de colheres, não poderá usar seus próprios talheres. Se pretender enxergar auras, terá que fazê-lo sob condições controladas. Se for realizar a visão remota, não terá crédito por se aproximar do acerto de forma vaga. Se for demonstrar seus poderes de radiestesia, prepare-se para ser testado sob condições controladas. Se for fazer cirurgias psíquicas ou apresentar estigmas, terá de fazê-lo com câmeras observando cada movimento”.

Outro contra-ataque dos espiritualistas e paranormais é dizer que da mesma forma que existem os desafios dos céticos, também existem os desafios daqueles que alegam possuir os legítimos poderes paranormais ou espirituais no sentido de conceder prêmios em dinheiro para quem conseguir provar qualquer tipo de fraude.


Recentemente, Victor Zammit, um defensor entusiasta do espiritismo e do médium físico David Thompson lançou um desafio oferecendo US$ 500.000,00 para quem conseguir provar que os fenômenos produzidos nas sessões deste médium são resultados de fraude. O problema é que o desafio não para aí. Caso nada se consiga provar, a outra parte é que deverá obrigatoriamente doar a mesma quantia para a causa do médium. Com esta contra partida intimidatória, acredito que dificilmente aparecerá algum corajoso para encarar este desafio.

Além disto, o mesmo Dr.Zammit também elaborou um outro desafio oferecendo US$ 1.000.000,00 para quem conseguir provar a falsidade das evidências da vida após a morte conforme relatadas em seu livro “Um Advogado Apresenta o Caso do Após-Vida” (http://www.victorzammit.com/skeptics/challenge.html). Um desafio tão conveniente quanto o exemplo do sujeito que inventa uma teoria que existe uma lata de Coca-Cola flutuando na constelação de Andrômeda e então pede para provarem que ele está errado. Isto é uma inversão da lógica! Quem elaborou a teoria é que tem que prová-la (se qualquer absurdo inventado e impossível de ser verificado cientificamente tivesse de ser aceito como verdade, então vamos acreditar em fadas e gnomos porque até hoje ninguém conseguiu provar que eles não existem).


Interessante é perceber que nenhum dos lados está disposto a se submeter às condições pré-impostas pelo outro lado. Os céticos se recusam aceitar estes desafios dos crédulos alegando que as condições impostas para verificação são inadequadas, mas por sua vez os crédulos se recusam aceitar os desafios dos céticos alegando que as condições impostas são unilaterais, tendenciosas e abusivas.

Mas as histórias destes tipos de desafios são assim mesmo. Cada um tem as suas devidas razões para não ousar entrar no terreno encantado ou controlado pelo outro.

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