terça-feira, 15 de março de 2011

Qual é a melhor explicação para o sofrimento?

por Cleiton Heredia


Conforme prometido, hoje pretendo abordar o mesmo assunto da postagem anterior, porém sob uma ótica um pouco diferente e que reflete minhas atuais convicções.

O raciocínio que eu usei no artigo que escrevi em 2004 pode muito bem satisfazer uma mente religiosa ansiosa por algumas explicações que conciliem a realidade, vivida e presenciada neste mundo, com o conceito de um Deus pessoal justo e amoroso que dirige o destino de todo o universo, bem como de cada ser vivo em particular (a Bíblia cristã ensina que nenhum pássaro ou fio de cabelo humano cai sem que Deus saiba e consinta). Porém, são explicações que satisfazem apenas uma mente doutrinada segundo os ensinamentos da Bíblia cristã.

Minha argumentação não serviria para pessoas que enxergam o universo por uma ótica diferente dos conceitos bíblico-cristãos. Por exemplo, no Japão, as recentes tragédias são vistas e entendidas pela grande maioria de japoneses segundo a filosofia dos dois principais segmentos religiosos daquele país: o xintoísmo e o budismo. Enquanto o pecado de Adão e as peripécias do Diabo explicam muita coisa para os cristãos, estes não fazem o menor sentido para quem não acredita que existiu Adão ou que exista uma criatura chamada Diabo.

Tendo em vista que cada religião ou filosofia tem a sua própria explicação para uma mesma pergunta: "Porque coisas ruins acontecem para pessoas boas?" É natural que a mente racional do ser humano, ao se deparar com tantas respostas diferentes e contraditórias entre si, faça outra pergunta na sequência: "Qual destas respostas reflete a verdade?"

Mas esta segunda pergunta é normalmente feita apenas por pessoas que se encontram em segurança desfrutando de saúde e um relativo conforto material. Quem está vivendo no meio do turbilhão do sofrimento geralmente não está muito interessado em avaliar o critério "verdade". Sua prioridade é simplesmente obter uma resposta que lhe proporcione explicação para o passado, conforto para o presente e esperança para o futuro.

As religiões, independentemente quais sejam, têm como objetivo proporcionar justamente isto para o ser humano:

- Uma explicação para o passado;
- Um conforto para o presente;
- E uma esperança para o futuro.

Você, meu amigo cristão, tenho certeza que se encontra plenamente satisfeito com as respostas que o seu segmento religioso lhe proporciona. Mas será que você entende que o japonês, que possui crenças diferentes da sua e que consequentemente entende o mundo de forma diferente, também pode estar plenamente satisfeito?

Jesus Cristo te trás explicação para o passado, conforto para o presente e esperança para o futuro? Que ótimo! Continue com sua fé firme nele. Mas, por favor, apenas entenda que uma pessoa com uma fé diferente da sua também pode perfeitamente acabar encontrando os mesmos benefícios psicológicos.

Quanto se trata do sofrimento individual é essencial que se respeite as respostas que cada um escolheu para si.

Que mundo trágico seria este se o sofredor não pudesse ao menos ter a liberdade de escolher a sua própria verdade?

2 comentários:

  1. Cleiton,

    Em um de seus livros, Bertrand Russell conta que, quando foi preso devido à sua postura política (isto é, perseguido), ao chegar na prisão, o guarda que lhe recebeu fez uma espécie de entrevista rápida e perguntou qual sua religião. Russell teria respondido "agnóstico" e o guarda teria replicado que não conhecia tal religião mas não importa, pois no fundo, ainda que de forma diferente, todas cultuam o mesmo Deus.

    Não se pode exigir do autêntico religioso muito mais do que este tipo de interpretação diante da crença alheia, visto que, se ele considerar legitimamente a possibilidade de estar completamente errado e o seu alheio estiver certo (fazendo uma busca legítima pela verdade, tal qual a sua), ele já estará deixando sua crença (e consequentemente, sua explicação, seu conforto e sua esperança) de lado.

    Creio ser esta linha de raciocínio a razão pela qual muitos religiosos se gabam de respeitar as religiões alheias, mas não suportam o ateísmo! As religiões alheias podem ser vistas como interpretação diferente da verdade que ele conhece, mas o ateísmo não, ele bate diretamente de frente! Como pode alguém querer negar explicações completas, conforto e esperança?

    No meio religioso, portanto, não cabe apenas o respeito, mas também a tolerância. É preciso permitir e defender o direito dos outros pensarem de forma diametralmente oposta. Isso não significa calar-se, mas sim não querer calar a ninguém.

    Abraços.

    ResponderExcluir
  2. Cleiton,

    Todos os seres vivos sofrem. A diferença em relação ao ser humano é que este pensa. Por pensar sai em busca de respostas. Tirando a razão do homem ele se comportará como se tudo fosse meramente natural...

    Enéias.

    ResponderExcluir